Mário Quintana profetizou verdadeiramente que o comum não nos atrai e o poeta estava certo. D. Ana de sensual não tinha nada, ao menos era o que ela pensava, uma senhora de quarenta e dois anos, dona de casa, mãe de dois filhos, fiel ao seu marido e vizinha de Pedro Antônio. Orgulhava-se de jamais ter sido traída por mulheres reais, apenas pelas Coelhinhas da Playboy dos pôsteres que enfeitavam a oficina e a imaginação de seu marido.
Pedro Antônio como quase todo bom rapaz de vinte e um que morra sozinho ou compra marmita ou vai comer a comida boa da vizinha. Estudava a noite engenharia e de dia trabalhava em um escritório, o tempo que lhe sobrava era para comer na casa dos vizinhos garantindo-lhes que mais tarde pagaria a forma em que eles o acolheram.
- Você quase não tem tempo para nada, menino. Coma mais devagar.
- Não posso D. Ana, logo o escritório abre e eu estou cheio de coisas para fazer. E a senhora o que fará esta tarde?
- Recolher roupas, lavar quintal, preparar a janta... – disse D. Ana com o olhar longe e cansado.
- Nossa vida deveria ser feita de momentos, mas, não passa de repetições – sussurrou – Muito bem, desculpa as poucas palavras, mas, a senhora sabe do meu tempo, mande um beijo aos seus filhos e avisa ao seu marido que o Santos será campeão este ano.
E nesta correria Pedro Antônio não tinha tempo para flertar com moças as quais ele poderia confiar como sua namorada, sua vida afetiva era recheada de casos e acasos que não passavam de uma noite. Como sempre sua vida resumia-se em correria, estudos e sussurros de como a vida deve ser. E entre um almoço e outro que Pedro Antônio passava ao lado de D. Ana pequenos diálogos revelavam uma mulher fora do comum ao meio em que Pedro Antônio vivia. Aos poucos o rapaz deixou de ligar tanto em chegar cedo ao trabalho e D. Ana aproveitava para exibir seus dotes culinários ao seu vizinho. D. Ana poderia ser vista por Pedro Antônio como uma mãe se exatamente a sua vista não tivesse o traído.
Por mais que Pedro Antônio relutasse por conta da amizade aos poucos seus olhares tateavam no corpo de D. Ana curvas que deixariam qualquer motorista experiente completamente perdido. A pele morena latina, lábios rosados sem batom, os braços torneados devido aos trabalhos domésticos, as coxas e os seios que jamais foram expostos por saias ou decotes atiçavam ainda mais a imaginação juvenil do rapaz.
- Será que um dia eu encontrarei alguém como a senhora?
Aquela pergunta fez com que D. Ana ficasse perdida em seus pensamentos, um rapaz de vinte e um anos fazendo-lhe tal pergunta, ela já havia visto as varias mulheres que se deitavam com o rapaz. Lindas, jovens, cheias de energia e já comuns. Não passavam de repetições. D. Ana sentiu pela primeira vez durante anos um ardor subir em seu corpo, sua autoestima ressuscitou e um sorriso casto saiu de seus lábios. Na verdade Pedro Antônio não tinha tempo para ver nada além do que seus olhos podiam ver, alimentava seus olhos de beleza e inflava seu ego de conquistas baratas. D. Ana conquistou seu tempo, mostrou-se ser uma mulher da qual ele queria repartir os serviços de casa, as histórias do escritório e seu coração. D. Ana não era comum aos olhos de Pedro Antônio, mas, deu-lhe a resposta mais comum que alguém pode dar nesta ocasião:
- Claro que sim, você merece alguém que te fará muito feliz, menino.
Naquela noite pela primeira vez em dois anos Pedro Antônio ouviu seus vizinhos fazer amor. E sabendo que aqueles sons e o amor platônico ferem mortalmente mudou-se na semana seguinte para perto de suas repetições: monótonas, sem emoção, mas, que deixam seu coração ileso. Comeu de marmita até que...
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